Au revoir Françafrique

Mais um golpe militar no Sahel. Porquê tanta preocupação do ocidente? Vamos por partes.

A importância do Níger para as potências mundiais vai muito além das aparências. Os Estados Unidos têm no terreno 1500 operacionais e uma enorme base de drones. 5% da produção global de urânio vem do país, crucial para França e UE reduzirem a dependência russa. Para além disso, após golpes no Mali e Burkina Faso, o Níger era o último aliado estável no Sahel, região essencial no combate a grupos jihadistas e no controlo de fluxos migratórios.

É o terceiro golpe em 3 anos, no Sahel. Agitam-se bandeiras russas na antiga Françafrique. Embora haja aproximações russas à Junta nigerina, elas são oportunistas, não premeditadas. As causas deste golpe são principalmente internas e com nuance.

Os holofotes estão sobre a CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental). Surpreendentemente, parece decidida a tomar as rédeas da situação e decidir independentemente dos interesses económicos de terceiros, ainda que pressionada pelas potências ocidentais. Para a CEDEAO, e a sua líder Nigéria esta é a hora de tomar uma posição, temem um efeito dominó. Por isso, exigem a restauração imediata do governo civil e ameaçam ações militares. No entanto, essa possibilidade é cada vez mais remota, devido a desafios logísticos enormes e à necessidade de apoio parlamentar nos países intervenientes. A Junta nigerina procura ganhar tempo e aliados (Burkina Faso e Mali já declararam apoio). Para enfrentar isto, a CEDEAO estabelece um “Dia D” para intervenção militar, caso a diplomacia não surta efeito embora não divulgue a data. (Compreensível já que a última vez que marcou um ultimato no calendário nada aconteceu, e certamente que os líderes da comunidade estão familiarizados com a história de Pedro e o lobo.

É um sinal importante a gestão de uma situação de instabilidade política estar a ser liderada por uma organização africana. Grandes potências não manipularão eventos com tanta facilidade, daqui para a frente. Independentemente disso, esta crise não tem fim à vista. E enquanto não tiver, a população sofrerá. O Níger é um dos países mais pobres do mundo, incrivelmente suscetível a alterações climáticas, sofre com ataques terroristas constantes e arrisca-se a perder apoio externo essencial. Estamos na iminência de um enorme fluxo migratório para o sul da Europa, que sobrecarregará ainda mais, campos de migrantes na região.

É uma crise humanitária à espera de acontecer.

Sérgio Salazar

Sérgio Salazar

Membro do Secretariado da JS Guimarães